Wednesday, March 01, 2006

QUANDO É QUE ALCOBAÇA DEIXARÁ DE CONTINUAR A PERDER MARCAS DE REFERÊNCIA?

Passadas quase duas semanas sobre esse acontecimento, ainda não se extinguiu a memória da conferência do historiador António Valério Maduro, nos Moleanos, no Lagar do Barreirão. O principal objecto de referência dessa bem sucedida comunicação foi A Produção do Azeite nas Terras de Alcobaça, também título de um notável livro daquele historiador, o tal livro cuja imensa maioria de exemplares continua presa, à má fila, algures num qualquer armazém do suposto Museu do Oeste e da realíssima Associação de Municípios do mesmíssimo Oeste... Aquela conferência contou com um público muito atento e interessado, de entre o qual tomo a liberdade de referir alguns espectadores que pareciam mesmo ter sido escolhidos a dedo para ali estar. Efectivamente, o antropólogo Carlos Batista, o Presidente do Projecto Lieder Oeste José Coutinho ou o Director do Mosteiro de Alcobaça Rui Rasquilho, foram não só atentos espectadores como perspicazes comentadores no período final de discussão e debate, período esse que contou também com outras motivadoras intervenções, a mais importante das quais se deveu a José António Canha, o alcobacense recentemente nomeado Presidente do Instituto de Desenvolvimento Rural e Hidráulica, cuja intervenção deixou mesmo no ar alguma esperança no que respeita a uma sua possível intervenção no desbloqueamento da edição do livro de António Valério Maduro...
Todavia, José António Canha evidenciou outro importante assunto numa das suas intervenções dessa tarde, referindo que o azeite produzido no concelho de Alcobaça poderá estar em vias de perder a sua denominação de origem, devido a ter já sido entregue uma proposta nesse sentido, feita pela Associação de Agricultores do Ribatejo à APRODER, entidade que presentemente certifica o azeite desta região, actualmente integrado na Denominação de Ordem Protegida de Azeites do Ribatejo. José António Canha sublinhou então que este problema não afectará apenas questões inerentes à qualidade e ao valor económico do azeite do concelho de Alcobaça, prejudicando inúmeros produtores das freguesias de S. Vicente de Aljubarrota e Turquel, afectando também o valor dos terrenos agrícolas dessas zonas, que, caso aquela proposta vingue, sofrerão enormes decréscimos. E recordamos que tudo isso poderá suceder numa região como a nossa, que já foi das mais importantes, a nível nacional, em termos de produção de azeite...
Aproveito ainda para relembrar que caso Alcobaça perca mais esta sua marca de referência, essa perda se sucederá a muitas outras que nos últimos anos se têm infelizmente sucedido, caso, por exemplo, do vinho desta região e de muitas das suas qualidades de fruta, de entre as quais apenas parece restar de pé a maçã deste concelho. Isto numa altura em que a chamada gripe das aves se poderá avolumar no horizonte como feroz inimigo da fama que resta do nosso frango na púcara e os chamados queijinhos de Alcobaça se deixam cada vez mais de ver nas montras da nossa cidade, tendo-se, segundo parece, mudado de armas e bagagens para Lisboa... Isto para não falar da história, cada vez mais fantasmagórica, da emancipação do porco malhado como marca de referência do concelho de Alcobaça... Como notável marca de referência de Alcobaça isolam-se cada vez mais os mediáticos The Gift, numa altura em que a nossa edilidade parece não se interessar mesmo nada por assuntos desta estirpe. Curiosamente, apenas um dos seus actuais vereadores, Rogério Raimundo, esteve presente naquela conferência de António Valério Maduro, dado que de entre os seus actuais colegas de vereação não se notou qualquer presença neste acontecimento promovido pelo Rancho Folclórico dos Moleanos. Embora dois deles tivessem prometido estar presentes...

Tuesday, February 28, 2006

ANOS 1960 PROMETEM REGRESSAR EM FORÇA NA BOLÍVIA!

Infelizmente, esta não é uma história de inspiração carnavalesca, embora o possa parecer. De há algum tempo a esta parte, um dos mais conhecidos ministros bolivianos vem defendendo que nas escolas do seu país se deveria alterar a actual distribuição de leite aos jovens alunos, trocando-a pela simples e directa administração de folhas de coca. Segundo esse ministro, David Choquehuanca, essa sua sugestão dever-se-ia essencialmente aos factos científicos de a coca conter muito mais cálcio que o leite e de ser muito mais rica em fósforo que o peixe. Todavia, parece-me que esse senhor, curiosamente Ministro das Relações Externas da Bolívia, se tem também esquecido de referir que no seu país a produção (quiçá indústria) de coca é muito maior que a de lacticínios ou a das pescas, não se importando de fazer as crianças mais desprotegidas do seu país pagar as favas desta sua autêntica tentativa de pedrada institucional (não sei se o homem costuma discursar ao som da Cocaine do Eric Clapton, mas parece)...
Uma das questões mais caricatas desta história é o facto de aquele ministro boliviano basear as suas teses e afirmações num estudo publicado durante a década de 1960 na Universidade de Harvard. Em plena década de fruição hippie, esse estudo apregoava, entre outras coisas, que enquanto um copo de leite tem apenas 300 miligramas de cálcio, uma simples folha de coca com 98 gramas proporciona 1540 de cálcio! Contudo, e segundo a oposição boliviana, aquele tão pouco inspirado ministro ter-se-á esquecido do simples facto de essa alteração adormecer completamente os desprotegidos alunos, em vez de os manter acordados e com as suas funções cerebrais em pleno, além de causar graves problemas de anemia... Curioso é também referir que a investigação harvardiana que sustenta essa ideia de David Choquehuanca foi pouquíssimo tempo depois pura e simplesmente renegada por aquela universidade norte-americana, iniciando um processo disciplinar cuja conclusão determinou também o afastamento do seu autor do seu corpo docente. Esse autor era, nem mais nem menos, o psicólogo Timothy Francis Lear, cujas experiências com drogas psicadélicas lhe valeram, não só uma desmedida admiração pelo movimento hippie como o próprio epíteto de "o apóstolo da droga". Timothy Lear continuou a sua vida encarnando uma espécie de objecto decorativo de festivais rock e performances hippies de gosto duvidoso, tendo mesmo merecido a dedicatória de uma melancólica canção dos deslavados Moody Blues, sob o título Legend of a Mind...
Todavia, este caso boliviano parece ter ainda mais gravidade do que aquilo que à primeira vista poderá parecer, dado que, este posicionamento do seu ministro se declara como uma espécie de primeiro passo no caminho de o actual governo da Bolívia pretender despenalizar completamente o consumo da coca, tese também apoiada pela dúbia alusão de que esse consumo permite lidar melhor com a fadiga e até a própria fome... Passando a questão para o nosso país, numa época em que, mais tarde ou mais cedo, será politicamente colocada a hipótese de despenalizar o consumo das chamadas drogas leves, recordo que estas coisas não se devem discutir com o ânimo leve ou o descarado oportunismo daquele ministro boliviano, necessitando, acima de tudo que os problemas sejam mesmo discutidos, enfrentados e resolvidos, atitude a que os portugueses estão politicamente pouco ou nada habituados... E se o rock tem sido desde sempre muito naturalmente aliado a estas questões, recordo aqui a desassombrada entrevista que Zé Pedro, um dos guitarristas dos Xutos & Pontapés, concedeu em Junho de 2004 ao nº1 da revista Cânhamo, na qual esclarecedoramente retrata um mundo em que apenas a inteligência permite a recusa e a opção por vias efectivamente mais saudáveis...