Thursday, March 30, 2006

A POESIA DO PÃO QUE A REVOLUÇÃO AMANHOU

PEQUENO CICLO DO PÃO
(O PÃO É A MULHER E O PÃO)

1
Como pão caseiro. Nada de folclore barato. Como apenas pão feito com mãos. Não de operária neste caso. De mulher caseira. De mulher com bigodes vagos despontando. De mulher de mãos ásperas ainda capazes do amor todavia. De mulher que eu amarei como o pão que devoro com vago sabor a vinagre. De mulher que pega na pá de madeira ressequida e deita no forno em massa os meus testículos liquefeitos em ternura e farinha. Apaixonado por ela até ao fim dos séculos.

2
Pão inspirador. Farinha dura. Eu Pavese tu como sonhador de moinhos pressentidos no limiar de tudo. De sexos e moinhos. Pois morder o pão é morder o moinho o sexo o mar a distância. Talvez o meu inevitável suicídio.

3
Comendo este pão sinto-me outro. Penso a sério na revolução sem farinha de arroz nem remorsos parvos.
É preciso que as forças populares se alimentem de trigo e vinho puros. Assim sairá saudável o rebento.

4
É claro que depois do dia tenho à frente muitos livros sobre a revolução a poesia o amor a metafísica. É claro que bebo vinho. É claro que escuto Chopin e Bach. E o Jazz. É claro que penso em ti Quintela meu amigo distante. É claro que penso na mulher. A mulher. É claro que beijo lambo em sonho a mulher. Dos pés ao sexo. Do sexo aos cabelos. É claro que trinco o pão da noite. É claro que vou sair de casa e aspirar o ar puro que vem directamente das flores fechadas à espera. Trincando o pão da noite.

5
Pão de trigo original mãos sóbrias de uma qualquer camponesa explorada e mulher até ao útero. Até no útero.
Qualquer coisa de criança e verdade onde me instalo devorando. Devorando e sentindo este gosto a sons de sol e blusa azul clara de infância como o papel sobre a carpete agora. Como a noite constante de pureza e redenção. Amante procurada até ao limite. Amante perseguida nua efémera possuída para sempre. Amante até ao infinito à loucura de entender. Pão de trigo. Noite evidente. Flor. Lápis sobre a carpete. Vinho claro. Livro sobre os joelhos. Amor nos nervos à espera do dia final da revelação. Da revolução. Pão. De trigo. Com vinagre e um vago aspecto de corpo infantl. Pão meu amor.

LEVI CONDINHO

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