Sunday, August 13, 2006

PROVAVELMENTE A HISTÓRIA NÃO O ABSOLVERÁ...

O ditador cubano Fidel Castro comemora hoje o seu 80º aniversário. Desses seus 80 anos de vida, 47 foram passados como dirigente máximo de Cuba. Embora o tivesse anteriormente prometido, nunca realizou qualquer género de eleições nem nunca permitiu qualquer género de liberdade política ou de imprensa no seu país... O seu regime confirmou ainda a sua tendência machista, nunca tendo permitido qualquer relevância política ao sexo feminino. Curiosamente, poucos reclamaram o facto de que nesse mesmo regime sempre tivesse sido predominante a raça branca, minoritária em Cuba... Com razoável sucesso propagandístico universal, Fidel elegeu como principal inimigo os Estados Unidos da América, o que lhe grangeou acenos e simpatias de muito boa gente por esse mundo fora... Talvez por isso, foi ontem divulgada em Cuba uma declaração assinada por 400 intelectuais de todo o mundo (entre os quais os portugueses José Saramago e Boaventura Sousa Santos) protestando contra uma hipotética invasão de Cuba pelos norte-americanos, caso Fidel, recentemente operado, acabasse por falecer após essa intervenção cirúrgica...
Acho muito curioso que (ainda) haja 400 intelectuais que assinem um documento daquele género. Muitos deles são escritores e jornalistas. Tipo de pessoas a quem Fidel nunca concedeu qualquer espécie de liberdade. Antes pelo contrário... Ao longo de quase cinco décadas, o regime liderado por Fidel tem mesmo oprimido e violentado inúmeros escritores e jornalistas cubanos. Nem mesmo o escritor francês Pierre Golendorf escapou às suas garras, curiosamente numa altura em que ainda militava no Partido Comunista Francês... Pelas prisões de Fidel passaram poetas cubanos como Jorge Valls, Armando Valladares ou Herbero Padilla, tendo mesmo este último sido por si obrigado a uma humilhante retratação, bem à maneira do que Estaline e o seu feroz comissário político Jdanov haviam algumas década antes feito ao compositor Dmitri Chostakovitch... Pelas torturas e prisões de Fidel passaram também jornalistas como Carlos Franqui, José Pardo Llado e Raúl Rivero Castañeda, e ainda há três anos a chamada "Primavera Negra de Cuba" levou à prisão de 75 oposicionistas de Fidel, dos quais 25 eram jornalistas, dos quais 5 ainda se encontram presos... A mesma (má) sorte tiveram sindicalistas cubanos como David Salvador e Francisco Miralles, que não fizeram mais que lutar por um sindicalismo livre no seu país...
Acho ainda muito curioso que muito boa gente gabe o suposto ascetismo de um homem que frui uma praia privativa e um luxuoso iate, não se coibindo de fumar charutos da melhor qualidade quando a maioria dos cubanos apenas tem ao seu alcance tabaco da pior qualidade e na menor quantidade possível. Fidel não dispensa também que as suas aparentemente modestas fardas sejam costuradas por um dos melhores estilistas e no melhor tecido de gabardina britânico...
Termino referindo insuspeitos escritores que ao longo de muitos anos protestaram contra a feroz repressão exercida pelo regime de Fidel Castro sobre os intelectuais cubanos: Eugéne Ionesco, Mario Vargas Llosa, Pier Paolo Pasolini, Jorge Luis Borges, Susan Sontag, Jorge Semprun, Camilo José Cela, Fernando Arrabal. A todos eles Fidel chamou posteriormente "Agentes da C.I.A."... Mas até mesmo o seu grande amigo Gabriel Garcia Marquez, muitas vezes acusado de silêncio cúmplice face aos desmandos de Fidel, protestou publicamente em 2003 contra a repressão então exercida durante a deprimente "Primavera Negra"...
Penso que contrariamente ao que o próprio uma vez proferiu, nem a História nem o povo do seu país alguma vez o absolverão! Pelo contrário, não tardará muito que o seu "Krutchev" surja em Cuba e seja o primeiro a denunciá-lo e condená-lo publicamente. Talvez então já seja tarde de mais para uma das mais temíveis ditaduras do século XX...

2 comments:

José Alberto Vasco said...

Caro Papo: embora eu não seja grande fã de comentários feitos no anonimato, não deixo de agradecer o qoe aqui fez, quanto a este post. Todavia, gostaria de recordar que o objectivo principal desse meu post é uma espécie de protesto quanto a uma espécie de branqueamento com que muita imprensa e grande parte da opinião pública europeia continuam abrindar o regime ditatorial dirigido por Fidel Castro. Os escritores, jornalista e sindicalistas que nele referi são-no de verdade e por isso têm pago nas prisões de Fidel Castro. Se um grande amigo de Fidel como o escritor Gabriel Garcia Marquez também tentou intervir na libertação do jornalista Raúl Rivero Castañeda é porque não acha que ele seja um desses supostos impostores a soldo do "dollar", não acha?
Não sei onde foi buscar a divisão de grupos étnicos que refere que os brancos são 60% da população de Cuba, quando os documentos que conheço sobre o assunto a situam entre os 27 e os 33%. E a verdade é que tem sido essa população branca de origem espanhola que continuamente tem controlado o poder em Cuba durante os últimos 47 anos... Quanto á questão da relevância do sexo feminino em Cuba em termos políticos, eu sei que efectivamente o regime de Fidel se gaba de ser o 6º país em todo o mundo com mais mulheres na sua "Assembleia Nacional". Sei também que o Conselho de Ministros do governo de Fidel tem 6 ministras presentemente no activo. Gostaria era que essa suposta força política do sexo feminino em Cuba correspondesse efectivamente a esse suposto equilíbrio em termos de influência governamental. Que medidas políticas importantes têm essas senhoras (que respeito) efectivamente tomado no seu país? Nesse âmbito recordo-lhe apenas que no último governos dirigido por Fidel Castro existiam 6 Vice-Presidentes, e todos eles eram do sexo masculino!
Não é efectivamente necessário ir pessoalmente a Cuba para ter noção do que politicamente lá se passa. Aliás, tal como se passava com os antigos países do chamado bloco soviético, a "Cuba Turística" apenas mostra a quem a visita aquilo que lhe convém... E já agora, caro Papo, confirme o que naquele país se continua a passar em termos de liberdade de imprensa, informando-se das medidas que o seu governo tomou recentemente, antes e após a intervenção cirúrgica a Fidel, quanto a possibilidades de os jornalistas terem ao seu dispôr informação sobre tudo o que efectivamente se tem passado...

José Alberto Vasco said...

Caro Mário Bernardes: agradeço muito o seu comentário e a sua intervenção neste debate. O seu relato vivencial sobre Cuba é um excelente testemunho que aqui fica registado. Contudo, respondo-lhe também que neste caso são também muito importantes e incontornáveis os dados históricos, que muitas vezes sublinham aquilo que presencialmente não nos é permitido constatar pessoalmente. Concordo acima de tudo com a parte final do seu comentário e as suas dúvidas quanto aos prematuros desaparecimentos de Che Guevara e Camilo Cienfuegos. Muitos testemunhos da época ajudam-nos a constatar que à época do derrube da ditadura de Fulgêncio Batista, o Comandante Cienfuegos era tão ou mais popular junto do povo cubano que o próprio Fidel. Curiosamente a tese oficial do seu desaparecimento num misterioso desastre de avião seria 12 anos depois copiada na China, pelo voraz Mao Tse- Tung e pelos seus sequazes, para explicar o não menos misterioso desaparecimento do seu suposto rival Lin Piao...
Muitos dos incontornáveis testemunhos históricos sobre os desmandos de Fidel no seu país foram mesmo dados a conhecer ao mundo por muitos dos seus antigos companheiros de armas, que entretanto dissidiram de alguns dos seus propósitos e de alguns dos seus modos de actuar e governar e acabaram por se exilar, após terem estado presos às ordens do regime de Fidel. Esse foi o caso, por exemplo, de obreiros da Revolução Cubana como os Comandantes Hubert Matos e Eloy Gutierrez Menoyo, do Capitão Tony Cuesta, do economista Justo Carrillo ou do Embaixador Gustavo Arcos, que tiveram melhor sorte que outros antigos companheiros de luta de Fidel, como o Comandante Jesus Carrera ou o herói estudantil Pedro Luis Boitel, assassinados pelas tropas leais a Fidel...
Remato este comentário, referindo novamente que um dos objectivos do meu post em questão era precisamente o de abrir um debate sobre a figura de um homem cuja imagem pública me parece sempre ter sido muitíssimo bem programada no sentido de lhe dar um aspecto de homem bom e afável, lidando exemplarmente com a imprensa mundial esse posicionamento. Esta não é uma questão de direita ou de esquerda, mas sim uma questão de humanidade ou desumanidade. Quando referi uma série de escritores que ao longo dos anos se foram insurgindo contra o modo como Fidel sempre lidou com os intelectuais cubanos que de algum modo se lhe opuseram, esqueci-me de mencionar Jean- Paul Sartre, que não terá também sido propriamente um homemde direita ou um "Agente da CIA", nem estado alguma vez a soldo dos EUA!