Monday, September 17, 2007

FILME DE MANOEL DE OLIVEIRA EXIBIDO NO CINE-TEATRO DE ALCOBAÇA

O Pelouro de Acção Social da Câmara Municipal de Alcobaça apresenta na terça-feira, 18 de Setembro, às 14 e 30, mais uma das Matinés de Cinema com que tem brindado os alcobacenses menos jovens, a 1 euro por bilhete, facto que não podemos deixar de saudar. Depois de ter orientado essencialmente a sua programação pelo cinema nacional de carácter mais popular, aquela entidade decidiu agora dar um ar da sua graça e apresentar um filme do maior cineasta português de sempre: Manoel Oliveira. Sabendo-se que o cinema de Manoel de Oliveira não é de fácil assimilação, aquela entidade decidiu programar para aquela sessão o filme Porto da Minha Infância, um documentário que o produtor Paulo Branco convidou o notável cineasta a fazer sobre a cidade do Porto, destinado ao Porto 2001- Capital Europeia da Cultura. Porto da Minha Infância conta com as participações especiais dos actores Maria de Medeiros, Leonor Silveira, Leonor Baldaque, José Wallenstein, Duarte de Almeida, Rogério Samora, António Fonseca, Ricardo Trepa e Jorge Trepa, bem como da escritora Agustina Bessa-Luís e do maestro Peter Rundel.
Segundo as palavras do próprio Manoel de Oliveira, este filme é "
Um documentário sobre o PORTO em 2001 era impossível agora, com a cidade em obras, e é cousa que poderei fazer depois. O que, por outro lado, foi bom, porque me proporcionou a oportunidade de evocar o Porto da minha infância, graças a algumas das minhas memórias, as mais simples e as mais ligadas à cidade. Considero o filme um documentário, embora tenha sido obrigado a algumas reconstituições, para que não ficasse reduzido a um álbum de fotografias. Finalmente, trata-se de certas recordações dum tipo de vida e de imagens de uma época passada que, embora relacionadas comigo, não constituem uma auto-biografia".
Já que a entidade organizadora do evento não parece muito interessada em divulgar muito sobre este filme de Manoel de Oliveira, tomo também a liberdade de seguidamente reproduzir um apontamento crítico que Jacques Parsi escreveu sobre Porto da Minha Infância: "
Com a liberdade de inspiração e o rigor de escrita que o caracterizam, Manoel regressa à sua cidade natal, a cidade do Porto. Ela já tinha inspirado o seu primeiro filme, Douro, Faina Fluvial, em 1931, e o filme que marca o seu regresso atrás da câmara em 1956, O Pintor e a Cidade. Nestas duas obras, Oliveira havia filmado aquilo que prendia o seu olhar. Em Porto da minha infância, ele escolheu filmar aquilo que já não existe e que só os olhos da memória, os olhos da "sua" memória, podem ainda ver. À imagem daquele primeiro plano onde uma orquestra invisível toca uma música misteriosa.
O Porto da infância, é ainda o Porto de antes do nascimento: uma cidade carregada de história, uma cidade de artistas e pensadores. E como que por um movimento em espiral, o filme desenvolve-se desde as ruínas da casa natal, à cidade do Porto, a toda a sociedade onde se trava a guerra dos sexos, na Europa. O último plano do farol que se abre sobre o infinito do mar e do mundo é a réplica, ou a rima se se quiser, a cores, do primeiro plano do primeiro filme do jovem Oliveira, setenta anos mais cedo... o Porto é também a cidade que viu nascer, depois de 1896, o cinema em Portugal...

Porto da minha infância é o filme de uma procura: fragmentos de lembranças, pegadas, testemunhos, marcas, bandas da actualidade, letras de canções, fotografias. Imagens de identificação por vezes incerta: estes dois homens que olham para a objectiva da câmara serão realmente os poetas Fernando Pessoa e José Régio? E esta mancha cinzenta? Essa sobre a qual a mão do realizador desenhou uma cabana, um pavilhão de jardim, será realmente a garagem onde o ele revelou o negativo do seu primeiro filme? Fumée de fumée, tout est fumée. A vida e a memória esfumaram-se. A voz da memória fala de uma garagem mas nós nunca vemos mais do que uma sombra, um fantasma. O passado é uma palavra em que se deve acreditar.

A casa natal desapareceu, a árvore da forca desapareceu... e as confeitarias, e o Palácio de Cristal, e a prima Guilhermina, o primeiro amor...
Por momentos, o filme da memória é tomado pela vertigem. Do camarote dos seus pais, Manoel, adolescente, assiste à opereta Miss Diable. O Manoel que vemos é, com efeito, o seu neto encarregado de o incarnar. Este observa em cena o Manoel que ele será oitenta anos mais tarde, o Manoel que ele é agora detentor do papel de um actor dos anos vinte, Estevão Amarante, que interpreta por sua vez o papel de um ladrão, que rouba o coração de uma mulher...".
Sendo eu tão fã de Manoel de Oliveira que continuo a considerá-lo "o único realizador português", resta-me esperar que aquela sessão seja bem sucedida e que Alcobaça volte brevemente a ver cinema de Manoel de Oliveira. Party seria uma boa solução...

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